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A cultura do litígio está em acelerada transição pelo uso de avançados métodos na resolução de conflitos. Os princípios instituídos pela Lei 13.140/2015 resultaram em notável salto na transformação e respectivo aprimoramento da via única judicial historicamente disponível em nossa sociedade. O êxito crescente nos resultados obtidos na mediação como processo com intervenção construtiva e participação de terceiro imparcial, possibilita àqueles que estão vivenciando situação de conflito a oportunidade do espaço com a interação e a dinâmica, focados em atender aos envolvidos. Além da qualificação acadêmica, o fator de diferenciação, para o sucesso na medição, é o perfil pessoal do Mediador. Nesse viés, importante contar com o desenvolvimento da cognição, do potencial de análise e síntese, estabelecendo a empatia necessária para a condução das desavenças, de forma cooperativa e prospectiva.
Qual a função do mediador?
Nas atividades do mediador temos o reestabelecimento da comunicação como prioridade básica no desenvolvimento da cadeia das relações para chegar-se ao êxito. Durante o processo de mediação, cabe ao mediador as atividades: promover o respeito; estabelecer virtuoso diálogo com os participantes (Rapport)[1]; disponibilizar escuta ativa; investigar os reais interesses e expectativas dos mediandos; identificar a natureza do conflito; estimular a criatividade dos mediandos para gerar opções; auxiliar a análise de soluções que possam satisfazer expectativas e necessidades dos envolvidos e atuar na construção do entendimento (acordo), assegurando a viabilidade.
Observa-se facilmente a importância que a experiência prática adquirida representa na proficiência de cada profissional. O diferencial em administrar e gerir tais funções são claramente percebidos quando se ultrapassa a “receita de bolo” na abordagem e diversidade de conflitos perante o amplo universo das pessoas envolvidas. Assim, como agente pacificador, o foco mais importante do mediador passa a ser o desenvolvimento pessoal voltado ao seu próprio aprimoramento cognitivo, além das ferramentas e técnicas próprias da mediação.
Como ser proficiente em distintas áreas na Mediação?
A mediação abrange espectro de múltiplas naturezas de conflitos, a flexibilidade que lhe é inerente e o respectivo potencial de adaptação, viabilizam notáveis resultados no campo cível, familiar, empresarial, da saúde, escolar, internacional, trabalhista, comunitário, ambiental e coletivo, tanto em contendas judiciais como as extrajudiciais. Os diferentes campos de atuação exigirão do mediador, além da qualificação básica, o seu desenvolvimento e visão com foco nas múltiplas especificidades. Por exemplo:
– Mediador familiar: tem por essência abordar aspectos emocionais, que além da formação específica em mediação familiar, o conduzirão para complementações buscando melhor suporte técnico, como: comunicação não violenta, empatia, desenvolvimento da linguagem, conhecimentos jurídicos sobre questões familiares (guarda, alimentos, convivência, partilha etc.), equilíbrio emocional, entre outros.
– Mediação empresarial: tem por essência conflitos de interesse financeiro, sendo o aspecto emocional meramente colateral, salvo nas contendas de empresas familiares. Diferente da mediação familiar, se faz necessário o mediador visualizar previamente os requisitos gerais do conflito, estudando seu contexto e respectivas variantes e seus desdobramentos futuro. Outrossim, há necessidade de entendimento em direito empresarial, tributário, sucessão e falência, licitações, societário, modalidades contratuais etc. Sem o conhecimento elementar desses dispositivos legais, o mediador encontrará obstáculos em ser resolutivo perante a terminologia jurídica e do direito empresarial que são intrínsecos nessa característica de mediação.
– Mediações nos demais campos da saúde, escolar, internacional, trabalhista etc., também necessitam que haja o entendimento elementar dos respectivos dispositivos legais para o fluxo e a dinâmica resolutiva nas tratativas.
– Mediações coletivas: nesse campo é de extrema relevância a formação e a respectiva experiência específica do mediador, cuja complexidade das questões tem dimensão ampliada em razão da pluralidade de interesses a serem harmonizados, a saber: reintegração de posse, mobilidade urbana, catástrofes ambientais, acidentes de grande porte, entre outros. São mediações que envolvem entes públicos e conjunto amplo de dispositivos legais inerentes ao litígio. Importante que o mediador disponha de elevada celeridade e destreza na gestão e no controle das atividades exercidas.
A observação revela a natural evolução e autoconhecimento do profissional na seleção do(s) campo(s) em que seu perfil terá o melhor enquadramento e desempenho técnico.
Que outras habilidades contribuem para a proficiência[2] do mediador?
Passo importante na trajetória de proficiência do mediador é seu entendimento de que o conteúdo do curso básico de capacitação de mediadores instituídos pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, reúne programação em estágio de iniciação no mercado profissional. A proficiência profissional exige do mediador o domínio e o desenvolvimento em habilidades complementares aos cursos obrigatórios de capacitação. São habilidades imprescindíveis para operacionalidade de suas atividades, como o aprimoramento tecnológico, crescimento constante da inteligência emocional para obter o necessário equilíbrio na condução das diferenciadas modalidades de conflitos e avaliação imparcial e frequente que ocorrem na trajetória de suas experiencias profissionais.
A recente realidade da pandemia na Sociedade Global trouxe reflexos e mudanças, internas e externas, nos procedimentos do Poder Judiciário. A mediação, de maneira acelerada, teve que enfrentar o desafio da migração do atendimento em ambiente presencial para o ambiente virtual. Esse desafio perante a nova realidade e mudanças para a resolução de conflitos com sistemática on line, demandou enorme esforço pessoal do mediador para rapidamente conhecer e dominar as tecnologias voltadas a gestão profissional em plataformas de diálogo. O pleno e diversificado domínio dos programas utilizados para a realização das sessões de mediação, asseguram sucesso no fluxo de comunicações e o consequente respaldo às interações envolvidas nas negociações. Nesse viés, há de se considerar ainda que integram os bastidores das sessões, demandas complementares ao mediador, tais como: percepção associada a veracidade de identidade dos participantes e os múltiplos aspectos vinculados a confidencialidade dos fatos contextualizados. Essa temática circunstancial exigirá do mediador ações com destacadas agilidade e perspicácia.
Potencializar-se exercitando continuamente as qualidades cognitivas e, assim, desenvolver habilidades em aplicá-las no exercício profissional da solução de conflitos deve ser foco e pensamento permanente. Cabe destaque a performance empática de melhor transportar-se ao colocar-se no lugar do outro, incorporar-se as necessidades dos envolvidos, evoluir pensamentos e sentimentos voltados a harmonização da problemática delineada no curso das sessões, será imprescindível para a gestão e condução da dinâmica das ações e reações de natureza verbal e sentimentos. Desenvolver a inteligência emocional proporcionará inúmeros benefícios como: diminuição dos níveis de ansiedade e estresse; minimizar questionamentos improdutivos sobre relacionamentos; ampliação da reciprocidade nas relações; assertividade na tomada de decisões; superação nos desafios e equilíbrio diante dos fatores emocionais.Esses ganhos irão potencializar o perfil profissional do mediador.
Como visualizar e melhor se posicionar perante o mercado profissional?
O ofício da mediação requer do profissional a constante observação e respectivas reflexões pessoais, perante as rápidas transições e ampliações no contexto especializado do mercado profissional. Dedicar-se à habituais momentos de reflexão em busca do autoconhecimento com finalidade de aferir o seu pendor; capacidades naturais, inclinações virtuosas, mecanismos de interação etc.correlacionando esses “achados” pessoais com os campos da mediação em que incorporem intensas afinidades, será determinante fator para escolha de como empreender e obter notoriedade no mercado da mediação.
São inúmeras as fontes de conhecimento que vão contribuir para o desenvolvimento do mediador. É importante estar preparado para atuar nas múltiplas dimensões humanas que envolvem pessoas, conflitos, emoções, sentimentos, necessidades, no momento de atuar como facilitador da comunicação entre indivíduos, propiciando ambiente favorável à geração de opções para negociações. Por derradeiro, vale assentar a dimensão multidisciplinar dos estudos que integram a magnitude do perfil e da formação do mediador, fatores imprescindíveis ao alcance da sua maturidade e proficiência.
Referências Bibliográficas:
– CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Manual de Mediação Judicial. 6ª Ed. p. 250.
– GOLEMAN, Daniel. Liderança. A inteligência emocional na formação do líder de sucesso. Rio de Janeiro: Objetiva, 2015.
– R. COVEY, Stephen. Los 7 hábitos de la gente altamente efectiva. Barcelona: Paidós, 1997.
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Luciana Severo é Mediadora e Conciliadora Judicial. Mestranda em Solução de Conflitos na AMBRA University/USA. Pós-graduada – Técnicas da Negociação, Conciliação, Mediação e Arbitragem – UNIVALI/SC Designer de Conflitos. Sócia da Acrópole Câmara Privada de Mediação e Conciliação.
[1] Rapport é um conceito do ramo da psicologia que significa uma técnica usada para criar uma ligação de sintonia e empatia com outra pessoa. Esta palavra tem origem no termo em francês rapporter que significa “trazer de volta”. O rapport ocorre quando existe uma sensação de sincronização entre duas ou mais pessoas, porque elas se relacionam de forma agradável.
[2] Proficiência é a demonstração de um conhecimento, competência e capacidade. Proficiência é um adjetivo para qualificar a pessoa que tem um total conhecimento sobre determinado assunto, que executa tudo com muita proficuidade, habilidade e competência. Vide: https://www.significados.com.br/proficiencia/