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Atualmente, a doença ocupacional é um tema com bastante recorrência em discussões no Judiciário Trabalhista e, por vezes, considera-se ter havido falha da empresa no tocante ao oferecimento de um ambiente laboral saudável.
Conforme dispõe a legislação brasileira, o empregador assume o risco de seu negócio, portanto, se torna responsável pelas situações envolvendo a empresa, salvo exceções previstas expressamente na Lei.
Neste sentido, compete à empresa cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, bem como instruir os empregados acerca das precauções para se evitar acidente ou doenças laborais, mantendo-se, principalmente, um ambiente saudável e regular, conforme previsão expressa do Artigo 157 da Consolidação das Leis do Trabalho.
A Organização Internacional do Trabalho, através da Convenção n.º 155, também, é clara ao estabelecer a necessidade de se observar medidas razoáveis e possíveis para evitar qualquer risco inerente ao ambiente de trabalho.
Muito embora a obrigação da empresa contenha previsão expressa nos regulamentos, o desafio enfrentado se acumula com a grande tendência ESG – Environmental, Social and Governance – que diz respeito ao comprometimento e responsabilidade da empresa frente aos consumidores, fornecedores, colaboradores e investidores no que pertine ao padrão e às boas práticas que definirão se a empresa é socialmente consciente, sustentável e bem gerenciada.
A tendência ESG tem sido muito exigida pelo mercado, principalmente, pelos stakeholders que preferem investir nas empresas com melhor visibilidade social e comprometimento ambiental, promovendo, desta feita, um retorno mais positivo para o investimento.
É, portanto, neste sentido, que o compliance deve atuar na prevenção de riscos laborais e na manutenção de um ambiente saudável, evitando-se acidentes e doenças, não só físicas, mas mentais. Nem sempre um ambiente fisicamente perfeito é saudável, posto que questões de ordem moral ou psicológicas podem influenciar negativamente.
Tem-se por necessário a criação de políticas e estratégias que priorizem o bem-estar do funcionário, a fim de aumentar sua produção, engajamento e harmonia. Um ambiente laboral desequilibrado apresenta imediatamente efeitos negativos, que impactam no desempenho do funcionário e na prestação dos serviços da empresa, situação que pode ser, facilmente, evitada com estratégias de compliance.
Além das obrigações para um ambiente fisicamente saudável, as quais estão regulamentadas não só pela legislação, mas, também, pelas Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Previdência, é necessário que a empresa se atente para os aspectos subjetivos, principalmente, quando envolver atividades de cunho insalubre, perigoso ou estressante.
Não é atoa que em janeiro/2022 o burnout[1] passou a ser classificado pela Organização Mundial da Saúde como uma doença ocupacional, enfatizando a necessidade já antecipada em 2007 pela ANAMATRA – Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho -, Tribunal Superior do Trabalho e a ENAMAT – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de magistrados do Trabalho – ao estabeleceram, por meio do Enunciado 39, a proteção à saúde mental trabalhador:
“Enunciado 39. É dever do empregador e do tomador dos serviços zelar por um ambiente de trabalho saudável também do ponto de vista da saúde mental, coibindo práticas tendentes ou aptas a gerar danos de natureza moral ou emocional aos seus trabalhadores, passíveis de indenização”.
Frise-se, ademais, que referida síndrome de Burnout foi destaque entre os assuntos estudados do mês de fevereiro da biblioteca Délio Maranhão no TST, ressaltando a preocupação dos pesquisadores e estudiosos acerca do tema.
Neste sentido é importante o investimento da empresa na construção de um programa de compliance específico para a saúde e segurança do trabalho, na qual envolverá investigação, auditorias e monitoramentos. Ainda, é imprescindível que haja a implementação de uma cultura colaborativa, envolvendo os funcionários, prestadores de serviços e a alta direção, propiciando, desta feita, uma melhor harmonia no ambiente. Deve a empresa se preocupar com o bem-estar de seu funcionário, promovendo o diálogo, treinamento, qualificação da equipe e fornecendo os equipamentos de segurança necessários.
Um funcionário não será produtivo se a cultura organizacional não se importar se ele se sente seguro ou não realizando certa atividade que envolva algum risco, ou alguma atividade que demande constante pressão ou, ainda, se sente dores e não possui a quem recorrer para um simples pedido de ajuda.
Quando há algum acidente de trabalho, na maioria das vezes, é decorrente de alguma falha na avaliação interna da empresa, posto que os riscos são passíveis de serem antecipados e monitorados. A falta de planejamento ou de monitoração nas questões envolvendo a saúde e bem-estar dos funcionários pode implicar em prejuízos incalculáveis e irreparáveis, além de ser passível de violação completa dos princípios da ESG e da visibilidade negativa frente ao mercado.
Em razão de todo o exposto, fica evidente que o compliance é um meio bastante viável, econômico e estratégico para a prevenção, manutenção e mitigação dos riscos decorrentes do ambiente do trabalho, valendo a famosa premissa do ex-procurador Geral da Justiça Americana Paul McNulty de que “Se você pensa que compliance é caro, tente não atendê-lo”.
Fontes:
Governo Federal. Disponível em: https://www.gov.br/
Organização Internacional do Trabalho. Convenção nº 155. Disponível em: https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236163/lang–pt/index.htm
ALVARENGA. R. Z. (2013). Meio Ambiente do Trabalho Saudável e Equilibrado: Proteção à Saúde do Trabalhador. Juslaboris. Rev. Eletrônica. Disponível em: https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/95514/2013_alvarenga_rubia_meio_ambiente.pdf?sequence=1&isAllowed=y#:~:text=Enunciado%2039.,seus%20trabalhadores%2C%20pass%C3%ADveis%20de%20indeniza%C3%A7%C3%A3o
Tribunal Superior do Trabalho. Burnout e o Direito do Trabalho” é o Tema do Mês da Biblioteca do TST. Disponível em: https://www.tst.jus.br/web/guest/-/-burnout-e-o-direito-do-trabalho-%C3%A9-o-tema-do-m%C3%AAs-da-biblioteca-do-tst
KPMG. Guia prático de compliance: o que você precisa saber para começar. Disponível em: https://midia.kpmg.com.br/comunicados/arquivos/livro-digital-guia-pratico-do-compliance-KPMG-v2.pdf
[1] Explicação dada pelo Ministério da Saúde e disponível emhttps://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/s/sindrome-de-burnout : “Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional é um disturbio emocional com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico resultante de situações de trabalho desgastante, que demandam muita competitividade ou responsabilidade.
A principal causa da doença é justamente o excesso de trabalho. Esta síndrome é comum em profissionais que atuam diariamente sob pressão e com responsabilidades constantes, como médicos, enfermeiros, professores, policiais, jornalistas, dentre outros.
Traduzindo do inglês, “burn” quer dizer queima e “out” exterior.
A Síndrome de Burnout também pode acontecer quando o profissional planeja ou é pautado para objetivos de trabalho muito difíceis, situações em que a pessoa possa achar, por algum motivo, não ter capacidades suficientes para os cumprir.
Essa síndrome pode resultar em estado de depressão profunda e por isso é essencial procurar apoio profissional no surgimento dos primeiros sintomas”.