Arbitragem marítima no Brasil

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O Brasil é um grande exportador de commodities e importador de mercadorias, onde o comércio marítimo desempenha um papel importante em aproximadamente 95% do comércio internacional do país. Por isso, a demanda por resoluções de disputas envolvendo disputas marítimas vem aumentando constantemente no país.

Antes de comentar sobre o cenário doméstico, vale ressaltar que o uso da arbitragem para resolver disputas internacionais está bem consolidado nos setores do transporte marítimo e comércio internacional. As cláusulas arbitrais são comumente adotadas pelas partes em contratos marítimos internacionais, em harmonia com a prática e os costumes do comércio marítimo.

A grande maioria dos procedimentos de arbitragem marítima são realizados em Londres, nos termos da LMAA, seguidos pela arbitragem em Nova Iorque, de acordo com as regras da SMA. Ambos consistem em procedimentos não administrados, enquanto as arbitragens marítimas realizadas em Cingapura, perante a SMAC, podem seguir um modelo híbrido, combinando métodos de arbitragem ad-hoc e institucional.

A opção por um método ou outro pode depender não apenas da jurisdição, das leis aplicáveis e da natureza da disputa em questão, mas também da cultura do local onde a arbitragem é conduzida. Todos esses elementos devem ser levados em consideração quando as partes selecionarem a escolha do fórum de direito e arbitragem a serem inseridos no contrato.

No Brasil, a cultura jurídica do contencioso judicial ainda é forte, apesar dos demorados processos judiciais, altas taxas de correção monetária e juros e de um sistema judicial super congestionado. No entanto, é justo dizer que, nas últimas duas décadas, a arbitragem tem sido difundida no país, especialmente nos setores corporativo, infraestrutura, energia e comércio.

Após a promulgação da lei de arbitragem em 1996, que teve sua constitucionalidade reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal apenas em 2001, algumas convenções internacionais relevantes foram ratificadas pelo país e diversas novas leis e regulamentos foram emitidos pelos Governos Federal e Estaduais estimulando o uso de métodos adequados de resolução de controvérsias².

Os tribunais brasileiros e o Poder Legislativo têm trabalhado para reconhecer a força e a importância dos métodos alternativos de resolução de conflitos no país, inclusive nos setores marítimo e portuário. Isso pode ser visto não apenas no novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), na nova lei de mediação (Lei 13.140/2015) e nas alterações à lei de arbitragem (Lei 13.129/2015), mas também, no Decreto Federal 8.465/2015, que regulamenta o uso da arbitragem para a resolução de litígios especificamente no setor Portuário, para disputas envolvendo administração pública e entidades privadas, complementando as disposições já estabelecidas pela Lei Brasileira de Portos (Lei 12.815/2013). Tais disposições foram posteriormente estendidas a outros setores logísticos, com a promulgação do Decreto 10.205/2019.

Tudo isso não seria possível se o país não possuísse instituições arbitrais fortes.

De fato, o Brasil conta com instituições de arbitragem confiáveis, como o Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA); o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC); a Câmara de Conciliação e Arbitragem da FGV; a Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem da CIESP/FIESP; o Tribunal arbitral da Câmara Internacional de Comércio (ICC); e outras.

E em termos de arbitragem marítima o Brasil também é bem servido.

O CBMA, instituição fundada em 2002 pela Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ), Federação Nacional das Empresas Privadas de Seguros e Capitalização (FENASEG) e Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN), possui uma comissão especializada para administrar a arbitragem de direito marítimo e portuário, com reconhecimento internacional, sendo listada como renomada “Associação de Arbitragem Marítima” na página do ICMA.³

Ao lado do CAM-CCBC, da Associação Brasileira de Direito Marítimo e de outras instituições conceituadas, o CBMA sediou o Congresso Internacional de Árbitros Marítimos, o ICMA XXI, no Rio de Janeiro, em 2020. O evento não só atestou a relevância e o potencial da arbitragem marítima doméstica, mas também colocou as Instituições e árbitros marítimos brasileiros em destaque do cenário internacional.

Curiosamente, logo após o Congresso já é possível ver algumas arbitragens marítimas sendo iniciadas no país e, mais importante, várias cláusulas arbitrais sendo inseridas em contratos de navegação offshore, contratos de afretamento e contratos de construção naval.

O Brasil tem um papel importante no mercado internacional de navegação, na exploração offshore de petróleo e gás, além de sua posição geográfica estratégica, vasta costa e sólidas instituições. Por isso, é inquestionável o grande potencial do país para se tornar um importante polo de arbitragem em disputas marítimas e de offshore.

Lucas Leite Marques1


¹ Sócio no escritório Kincaid Mendes Vianna Advogados ; Diretor de Direito Marítimo e Portuário do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem

2 E.g. Lei 8.307/1996 (Lei de Arbitragem); Decreto 4.311/2002 (Convenção de Nova Iorque de 1958); Lei 13.129/2015; 13.140/2015 (Lei de Mediação); Lei 13.105/2015 (Código Processual Civil, estimulando o uso da mediação como etapa preliminar para todos os processos judiciais); Lei 12.815/2013 (Direito Portuário, que estabelece a possibilidade de arbitragem com a administração pública); Decreto 8.465/2015 (regulamentação da arbitragem com a administração pública no setor portuário); Decreto 10.0205/2019 (regulamentação da arbitragem com a administração pública nos setores de portos, transporte rodoviário, transporte ferroviário, transporte hidroviário e transporte aéreo)

³ https://icmaweb.com/maritime-arbitration-associations

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