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No Brasil a lei que trata da Prevenção à Lavagem de Dinheiro, (PLD) é a Lei Nº 9.613, de 3 de março de 1998 e em seu art. 10 impõe que as pessoas obrigadas, aquelas elencadas em seu art. 9, devem implementar procedimentos de identificação e monitoramento destinados a conhecer os clientes, identificando, entre outras coisas, Pessoa Politicamente Expostas. No entanto, tal atividade, é muito mais complexa do que se pode imaginar. Sendo assim, o presente artigo visa responder à pergunta: É possível terceirizar as atividades de PLD?
Os órgãos fiscalizadores das pessoas obrigadas elencadas pela Lei 9.613/98 em seu art. 9, por sua vez, publicaram normativas para regulá-la.
Tais normativas dispõem sobre as políticas, procedimentos e controles internos destinados especificamente à prevenção e combate ao Crime de Lavagem de Dinheiro ou Ocultação de Bens, Direitos e Valores e aos crimes com que eles possam estar relacionados.
Entre eles está a implementação de procedimento de identificação, monitoramento destinados a conhecer os clientes, identificando Pessoa Politicamente Expostas, que façam parte desse cliente.
A necessidade e importância da execução por parte dos setores obrigados pelo COAF a efetuar os procedimentos e controles internos destinados à PLD, estabelecidos por normas específicas dos diferentes setores é inegável e bastante conhecida.
No entanto, não são todos as empresas que conseguem se organizar e ter uma área especializada e dedicada para tal labor, pois este necessita conhecimento técnico específico, ferramentas de tecnologia, recursos e tempo. Muitas empresas, simplesmente não possuem todos esses fatores reunidos. Em empresas menores e menos complexas, com um número menor de funcionários, é possível inclusive, que nem conheçam a obrigatoriedade da lei 9613/98. Não obstante, o artigo 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-lei 4.657, de 4 de setembro de 1942), estabelece: “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”.
A atividade de PLD é muito mais complexa do que se pode imaginar, exigindo a participação de diversos atores com responsabilidades específicas conforme elenca, a respeito das instituições financeiras, a Redação do Instituto de Prevenção à Lavagem de Dinheiro em seu artigo: Os agentes integrantes do sistema nacional de PLD-CFT, nos demonstra exatamente isso, quando nos explica as fases dessa ativade, bem como os atores nela envolvidos, tais como Banco Central, Ministérios Públicos, tanto Federal quanto os Estaduais, COAF, Laboratórios de Tecnologia contra a Lavagem de Dinheiro, tendo cada qual sua responsabilidade respectiva, podendo incluvise chegar ao Poder Judiciário se por ventura, efetivamente ocorra um caso.
É muito fácil imaginar uma grande corporação possuindo uma área específica para desenvolver tais atividades, no entanto, devemos virar nossa atenção para aquela pequena atividade que não é uma grande empresa, como por exemplo, uma atividade de comercialização de bens de luxo, organizadas em pequenos brechós e joalherias artesanais, ambas pessoas obrigadas perante a lei n° 9.613/88, respetivamente nos incisos XII e XI do art.9º.
Explica a complexa atividade que esses pequenos empreendedores devem realizar, a Redação do Instituto de PLD em seu artigo: 01: Pessoas obrigadas não convencionais e o mercado de itens de luxo, segundo o qual as empresas obrigadas devem analisar qual a origem dos bens de luxo, uma vez que a procedência nem sempre é válida, por exemplo, no caso da compra de ouro e prata, os profissionais da indústria de gemas e joias devem ter muito cuidado com a origem dessa matéria-prima, pois há muitos casos de produção ilícita, que ocorre através de desmatamento de áreas protegidas, expropriação de terras, trabalho escravo, corrupção, violações dos direitos humanos, bem como de outros fatores que contribuem para a destruição ambiental.
Tudo isso além do que já tem que fazer todas as pessoas obrigadas de identificar os clientes, manter os registros e reportar ao COAF caso algo suspeito ocorra.
Veja, o quão complexo é a atividade de PLD e o que se espera que uma pessoa obrigada, segundo a lei, faça para estar em cumprimento com a legislação. Essa não é tarefa nem fácil e muito menos para amadores. Aquelas pessoas que vão desempenhá-la necessitam ter um grau de especialização e conhecimento muito elevados. Sem falar nas ferramentas necessárias para o desempenho de tais atividades para o alcance das finalidades propostas pela lei.
A Recomendação 17 do GAFI autoriza textualmente que os países poderão permitir que as instituições financeiras recorram a terceiros para implementar as medidas preventivas:
“Os países poderão permitir que as instituições financeiras recorram a terceiros para executarem os elementos (a)-(c) das medidas de DDC estabelecidas na Recomendação 10 ou para iniciar negócios, desde que sejam cumpridos os critérios abaixo. Quando for permitido tal recurso, a responsabilidade final pelas medidas de DDC permanece com a instituição financeira que recorre ao terceiro.”
A recomendação 10, por sua vez é a que estabelece a obrigatoriedade de devida diligência.
E nessa linha o Banco Central do Brasil que regulariza e fiscaliza as Instituições Financeiras e demais instituições que ele autoriza a funcionar, por meio de sua Circular nº 3.978, de 2020 , estipula:
- É vedada:
I – a contratação de terceiros para a realização da análise referida no art. 43; e
II – a realização da análise referida no art. 43 no exterior.
Parágrafo único. A vedação mencionada no caput não inclui a contratação de terceiros para a prestação de serviços auxiliares à análise referida no art. 43
Por sua vez, o art. 43 estabelece:
“As instituições referidas no art. 1º devem implementar procedimentos de
análise das operações e situações selecionadas por meio dos procedimentos de monitoramentoe seleção de que trata o art. 39, com o objetivo de caracterizá-las ou não como suspeitas de lavagem de dinheiro e de financiamento do terrorismo”
É dizer que todas as Instituições reguladas e fiscalizadas pelo BCB podem buscar recursos externos para melhorar seu programa de PLD.
De todas as normas vigentes editadas pelos órgãos reguladores/fiscalizadores visando o cumprimento da atividade descrita na Lei nº 9.613/98, acima elencadas, a Circular do BCB, é a única que toca nesse assunto.
Todas as outras nem permitem e nem impedem.
Quando o GAFI foi criado, ele pretendia proteger o sistema financeiro contra a Lavagem de Dinheiro e aos poucos, esse órgão intergovernamental criado em 1989, durante a reunião do G7, em Paris foi crescendo e passou a englobar a economia em geral, bem como as ameaças do Financiamento ao Terrorismo e do Financiamento da Proliferação de Armas de Destruição em Massa. Logo, não é de se espantar que haja elencado na redação de suas Recomendações, apenas as “Instituições Financeiras”, o texto tão-somente não foi revisitado, para englobar “outros setores da economia”.
Cumpre destacar que, assim como o BCB, todas as outras pessoas obrigadas, que possuem seus próprios reguladores e fiscalizadores, como a Agência Nacional de Saúde, a Comissão de Valores Mobiliário, Superintendência de Seguros Privados, entre outras, não recebem tratamento distinto no art. 9º da lei nº 9.613 de 1998, logo, não teria motivo para que a uma pessoa obrigada possa ser permitida a terceirização de sua atividade de PLD e para as outras não.
Além disso, segundo o princípio da legalidade presente no art. 5º II da CRFB/88 : Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei
É dizer; se a lei não proíbe a terceirização em comento, não cabe ao intérprete fazê-lo.
Importante salientar que aqui não se está falando de uma terceirização da atividade fim da companhia ou de um setor estratégico, mas sim de uma atividade específica, que, por meio de um profissional e/ou empresa especializados, com o mais alto nível de expertise e competência, darão um tratamento mais específico e adequado a esse tema, com a finalidade de alcançar o bem maior que é a prevenção desse crime, nefasto para nossa sociedade.
No mesmo sentido entende a Redação do Instituto da Prevenção de Lavagem de Dinheiro em seu artigo: Terceirização das atividades de PLD: quando vale a pena? Que segundo o qual “Como se trata de um tipo de atividade muito sensível, os órgãos reguladores vedam que se terceirize todo o processo. Em especial, cabem às pessoas, exclusivamente, a análise de situações suspeitas e tomada de decisão à sua comunicação à Unidade de Inteligência Financeira (no caso, o Coaf). No entanto, no parágrafo único do Artigo 44 da Circular nº. 3.978/2020, o Banco Central Brasil especifica que a “não contratação de serviços de contratação de terceiros/contratação para contratação de serviços de contratação”. Dito de outro modo admitir-se implicitamente várias possibilidades de auxílio terceirizado no cumprimento das medidas de PLD.”
Ora, aqui não se está falando em terceirizar a responsabilidade, pois esta, nunca será terceirizada, estando inclusive dessa forma estabelecida na Recomendação do GAFI supracitada, a de número 17:
“Quando for permitido tal recurso, a responsabilidade final pelas medidas de DDC permanece com a instituição financeira que recorre ao terceiro.”
No entanto, a responsabilidade, pode ser mitigada se for possível comprovar que a empresa contratada tem boa reputação no mercado, bem como, que a solução da terceirização foi escolhida, não para diminuir o custo da atividade, mas sim, para torna-lo mais robusto e porque não possível, já que muitas pessoas jurídicas, contrariando a lei, acabam por não implementar controles por desconhecimento ou incapacidade de cumprir com a atividade, utilizando apenas o pessoal dentro de seus quadros, por não possuir ferramentas adequadas e/ou por não terem recursos suficientes.
A solução da terceirização das atividades de PLD/FT/P não será utilizada por todas as pessoas obrigadas, não porque não possam, mas porque algumas de fato estão vocacionadas e têm a possibilidade de internalizar o procedimento, mas para aquelas que estão impossibilitadas, o recurso da terceirização, pode e deve ser usado, se isso significar o cumprimento da lei.
Nesse breve artigo buscamos identificar como a PLD é uma atividade complexa para as empresas pertencentes dos setores obrigados, principalmente naqueles casos em que as pessoas obrigadas não são grandes corporações e por isso não possuem setores especializados e capazes de desenvolver a atividade dutilizando-se de seu quadro próprio de funcionários.
No entanto, isso não retira o mando legal. E por isso, acreditamos salutar a possibilidade da terceirização desse tipo de atividade, mesmo porque essa possibilidade tornará possível que a lei seja cumprida da melhor forma possível, utilizando-se de mão de obra especializada e ferramentas adequadas, que do contrário não seria possível, pois, muitas das empresas que lançariam mão dessa opção, não são vocacionadas e não conhecem a lei profundamente.
Permitindo que um terceiro especializado tome as rédeas desse processo, a atividade passará a ser bem estruturada, contará com avaliação contínua e tenderá a agregar valor, mitigando riscos e aumentando a eficiência dos sistemas, utilizando-se de recursos especializados, tanto humanos como tecnológicos. Possibilitando dessa maneira, não só o cumprimento da lei, mas o alcance de sua finalidade, prevenindo a lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo.
Confira também uma palestra sobre lavagem de dinheiro em crimes internacionais.