O contexto do árbitro de emergência- o ambiente externo

O contexto do árbitro de emergência- o ambiente externo (1)
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A figura do árbitro de emergência, embora tenha recebido no Brasil maior atenção nos últimos anos, possui substrato de existência e validade na arbitragem internacional há tempos, em especial por intermédio de edições de regulamentos na segunda metade do século XX.

O marco referencial para o início da modalidade em comento foi o Regulamento de Procedimento Cautelar Pré-Arbitral da Corte Arbitral da Câmara de Comércio Internacional (International Chamber of Commerce – CCI), com vigência a partir 1° de janeiro de 1990, a qual assegurava a remessa do caso de urgência ao árbitro de emergência[1], então denominando de referee rules.

A esse respeito, indica-se que o referee rules versava sobre um termo que as partes, dotadas da arbitrabilidade subjetiva – capacidade da parte de participar da arbitragem[2]-, deveriam formalizar em instrumento apartado a convenção arbitral.

É importante mencionar que o artigo 27° do Regulamento de Arbitragem da Comissão Econômica para a Europa da ONU de 1963, e artigo VI, item 6, do Regulamento de Arbitragem de 1966 da Comissão Econômica das Nações Unidas para Ásia e Extremo Oriente, previam a possibilidade a possibilidade da análise de medidas cautelares com o fito de tutelar os direitos das partes, contudo, não apresentava a ideia do árbitro de emergência.

A assertiva anterior em muito se assemelha com a Lei Modelo da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacionalsobre Arbitragem Comercial Internacional (United Nations Commission on International Trade Law – UNCITRAL), em seu artigo 17-J, visto que previu em 1985 a possibilidade de análise de medidas provisórias e providências cautelares a serem realizadas pelo Tribunal Arbitral.

Diferentemente do apresentado, o Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem (CONIMA) indica que a primeira previsão expressa do árbitro de emergência foi em 2006 no regulamento da Centro Internacional para Resolução de Disputas da Associação Americana de Arbitragem (International Center for Dispute Resolution –  American Association Arbitration – ICDR)[3], o qual indicou no artigo 37(5) que “O árbitro de emergência terá poderes para conceder qualquer medida cautelar de proteção que julgue cabível, incluindo obrigação de fazer, não fazer e medidas cautelares de proteção ou conservação de propriedade”.

No início dos anos 2010, o árbitro de emergência ganhou mais relevo no cenário internacional, com destaques havidos pelas inserções expressas nos regulamentos do Instituto de Arbitragem da Câmara de Comércio de Estocolmo (Arbitration Institute of the Stockholm Chamber of Commerce – CCE) e do Centro Internacional de Arbitragem de Singapura (Singapore International Arbitration Centre – SIAC), dispondo expressamente sobre o árbitro de emergência e o procedimento para sua participação.

Mesmo com os regulamentos importantes sendo editados para incluir o árbitro de emergência, a mudança de patamar do instituto ocorreu em 2012 após a Corte Arbitral da Câmara de Comércio Internacional dispor em seu regulamento[4], no artigo 29[5], a possibilidade das partes requererem a atuação do árbitro de emergência em casos que não possam aguardar a instauração do Tribunal Arbitral[6].

O artigo 29 foi um insumo para que grandes instituições de arbitragem atualizem seus regulamentos, como a Corte Internacional de Arbitragem de Londres (London Court of International Arbitration – LCIA), a Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (CAC), a Corte de Arbitragem de Madrid (Corte de Arbitraje de Madrid) e o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC), dentre diversas outras.

Os próximos textos discorrerão sobre: o contexto do árbitro de emergência- o ambiente interno; a adesão ao árbitro de emergência opt in e opt out; as tutelas cautelares e de urgência voltadas ao árbitro de emergência; a atuação do árbitro de emergência diante dos preceitos da agilidade, da especialidade e da confidencialidade nos Tribunais Arbitrais; o árbitro de emergência com vistas à agilidade, à especialidade e à confidencialidade sob o prisma de pesquisa de dados; e, por fim, será apresentada uma única conclusão sobre os seis textos.

Leia também sobre a diferença entre conciliação, mediação e arbitragem.


[1]     Corte Arbitral da Câmara de Comércio Internacional. Disponível em: https://iccwbo.org/publication/rules-pre-arbitral-referee-procedure/. Acesso em: 09 de setembro de 2021, às 11h02min.

[2]     COSTA E SILVA, Paula. A Arbitrabilidade de Medidas Cautelares nos Direitos Português e Brasileiro. In: Revista Brasileira de Arbitragem. Volumento I. Issue, abril de 2004. pp. 83-84.

[3]     Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem. Disponível em: https://conima.org.br/arbitro-de-emergencia-uma-interessante-alternativa/. Acesso em: 09 de setembro de 2021, às 11h12min.

[4]     Corte Arbitral da Câmara de Comércio Internacional. Disponível em: https://iccwbo.org/publication/2021-arbitration-rules-and-2014-mediation-rules-portuguese-version/. Acesso em: 09 de setembro de 2021, às 11h04min.

[5]     “ARTIGO 29 Árbitro de emergência. 1 A parte que necessitar de uma medida urgente cautelar ou provisória que não possa aguardar a constituição de um tribunal arbitral (“Medidas Urgentes”) poderá requerer tais medidas nos termos das Regras sobre o Árbitro de Emergência dispostas no Apêndice V. Tal solicitação só será aceita se recebida pela Secretaria antes da transmissão dos autos ao tribunal arbitral nos termos do artigo 16 e independentemente do fato de a parte que requerer a medida já ter apresentado seu Requerimento de  Arbitragem. 2 A decisão do árbitro de emergência se revestirá da forma de ordem. As partes comprometem-se a cumprir qualquer ordem proferida pelo árbitro de emergência. 3 A ordem do árbitro de emergência não vinculará o tribunal arbitral no que tange a qualquer questão, tema ou controvérsia determinada em tal ordem. O tribunal arbitral poderá alterar, revogar ou anular uma ordem ou qualquer modificação a uma ordem proferida pelo árbitro de emergência. 4 O tribunal arbitral decidirá qualquer pedido ou demanda das partes relativo ao procedimento do árbitro de emergência, inclusive a realocação dos custos de tal procedimento, e qualquer demanda relativa a, ou relacionada com, o cumprimento ou não cumprimento da ordem. 5 Os artigos 29(1)-29(4) e as Regras sobre o Árbitro de Emergência previstas no Apêndice V (coletivamente as “Disposições sobre o Árbitro de Emergência”) serão aplicáveis apenas às partes signatárias, ou seus sucessores, da convenção de arbitragem, que preveja a aplicação do Regulamento e invocada para o requerimento da medida. 6 As Disposições sobre o Árbitro de Emergência não são aplicáveis quando: a) a convenção de arbitragem que preveja a aplicação do Regulamento foi concluída antes de 1° de janeiro de 2012; b) as partes tiverem convencionado excluir a aplicação das Disposições sobre o Árbitro de Emergência; ou c) a convenção de arbitragem em que se baseie o requerimento tiver por fonte um tratado. 7 As Disposições sobre o Árbitro de Emergência não têm a finalidade de impedir que qualquer parte requeira medidas cautelares ou provisórias urgentes a qualquer autoridade judicial competente a qualquer momento antes de solicitar tais medidas e, em circustâncias apropriadas, até mesmo depois de tal solicitação, nos termos do Regulamento. Qualquer requerimento de tais medidas a uma autoridade judicial competente não será considerado como infração ou renúncia à convenção de arbitragem. Quaisquer pedidos e medidas adotadas pela autoridade judicial deverão ser notificados sem demora à Secretaria”.

[6]     CAVALEIROS, Philippe; KIM, Janet (Hyun Jeong). Emergency arbitrators versus the Courts: from concurrent jurisdiction to practical considerations. In: Maxi Scherer (ed), Journal of International Arbitration. Vol. 35, issue 3. Kluwer Law International, 2018. p. 278

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Rafael Gomes
Advogado e Coordenador Jurídico. Graduado em Direito pela FMU, Pós-graduado em Processo Civil pelo Damásio Educacional, MBA Executiva: Gestão e Business Law pela FGV e Mestre em Ciências Jurídicas com ênfase em Resolução de Conflitos pela Ambra University. Professor Tutor na FGV e Professor da Graduação da Ambra University. Membro da IBDFAM, da AASP e de Comissões da OAB/SP.