Representatividade na escola

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Em 1961 foi instituída a primeira Lei que trata sobre a educação inclusiva no Brasil, a chamada Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 4.024), que determinava que toda iniciativa privada que fosse considerada eficiente pelos conselhos estaduais da educação receberia do poder público tratamento especial mediante bolsa de estudos, empréstimos e subvenções.

A responsabilidade pelo acolhimento de alunos, ditos “excepcionais”[1], até então era de responsabilidade das escolas especiais desenvolvidas para este fim exclusivo de educar, tendo tal regramento sido flexibilizado em 1989 com a Lei 7.853 para determinar a obrigatoriedade de inserir a educação especial na rede pública de ensino.  

A sociedade e as regulamentações sobre o tema se alteraram com o passar dos anos até que em 2015 foi instituída a Lei de Inclusão da Pessoa com Deficiência com intuito de assegurar e promover, em condições de igualdade, os direitos e liberdades fundamentais daquele que possuem algum tipo de deficiência inserindo-o na sociedade e determinando, portanto, sua inserção, compulsoriamente, na rede pública e privada.

O arcabouço jurídico conta com normativos específicos sobre a obrigatoriedade da escola acolher o aluno com deficiência, seja ela física, mental, intelectual, sensorial, oculta determinando, inclusive, penalidades graves em hipótese de negativa.

Cultura organizacional

A escola é um dos principais locais em que as crianças e jovens aprendem a viver com as diferenças, bem como a respeitar o outro, seja ele detentor de alguma deficiência ou não.

O acolhimento de um aluno com deficiência demanda preparo, dedicação e estrutura, o que por vezes torna-se necessário investir recursos e pessoal para atender aos fins da legislação e, principalmente, cumprir com o dever social, insculpido na Carta Magna.

A Lei 7.853/1989 é expressa ao determinar no seu Artigo 8º, inciso I, que é crime, punível com pena de reclusão de 2 a 5 anos e multa a recusa, cobrança de valores adicionais, suspensão, procrastinação ou cancelamento de inscrição de aluno em estabelecimento de ensino, seja ela pública ou privada, em razão de sua deficiência.

Inobstante, apesar de se tratar de uma obrigação legal passível, inclusive, de penalização, é indene que a cultura organizacional deve estar alinhada à importância da inclusão escolar, pois, do contrário, as chances do regramento não ser cumprido, sob as mais variadas justificativas e artimanhas, serão enérgicas.

Vale lembrar que o 10º pilar do compliance refere-se à diversidade e inclusão e, por certo, não há efetividade de um programa de integridade sem que exista respeito e igualdade, motivo pelo qual “A disseminação da consciência ética e moral para a promoção de uma cultura de integridade é mais do que necessária para que todos tenham ciência e garantam a aplicação das regras e condutas da organização.(LEC, 2022)

A alta administração deve ter consciência da importância da temática para disseminar a cultura e agir em conformidade legal acolhendo a pessoa com deficiência e contribuindo para a evolução do ser humano.

Para que a luta pela inclusão seja validada, é preciso se colocar no lugar do outro que por vezes busca por uma qualidade de ensino adequada e é, sumariamente, negada. Não se desvaloriza aqui a dificuldade que as instituições de ensino têm para o acolhimento, contudo, tal não pode ser empecilho para a não realização de melhorias dentro da escola, principalmente, no que pertine à capacitação dos professores.

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Governança e gestão

A implementação de um programa de compliance na escola, o que já foi objeto de discussão nesta coluna, contribui para a mitigação da desigualdade, da violência escolar, do bullying desenfreado e do abandono escolar.

E mais, os mecanismos a serem implementados favorecem a melhora do clima organizacional, bem como a eficiência na gestão dos recursos e a melhoria da performance de docentes e discentes propiciando um ambiente aberto à aprendizagem e à promoção do dever social. Neste sentido, efatiza-se os dizeres de Diogo Goes (GOES, 2023):

“As práticas pedagógicas inclusivas relacionadas com os mecanismos de prevenção da discriminação e a mediação de conflitos potenciam a melhoria do clima organizacional, favorecendo a eficiência na gestão de recursos e a melhoria da performance de docentes e discentes (ROSITO et al., 2021), criando assim um ambiente propício às aprendizagens, promotor da emancipação social”.

A governança no ambiente escolar objetiva o desenvolvimento de técnicas para manter-se no mercado, atraindo clientes, gerando um fluxo financeiro sustentável e contribuindo para a tomada de decisões de uma forma mais acertada.

É preciso planejamento, compromisso e gestão da instituição de ensino para lidar com as mais variadas deficiências e, concomitantemente, é preciso valorizar o profissional que se propõe à educação escolar incentivando-o a sempre melhorar e não a desistir frente aos desafios propostos. E mais, é preciso investir em um ambiente de trabalho saudável, contribuindo, desta feita, para o não adoecimento do corpo e da mente.

Desenvolvendo a inclusão escolar

Não há dúvidas que os desafios são grandiosos para as escolas, podendo-se citar: [i] a falta de profissionais especializados em determinadas deficiências, como a auditiva, que necessita de um tradutor; [ii] a necessária adaptação da estrutura escolar, como nos casos de pessoas que utilizam cadeira de rodas; [iii] o investimento financeiro para a capacitação dos professores e demais colaboradores da escola para aprender a lidar com determinada deficiência, como as pessoas com transtorno do espectro autista ou daquele que tem o Transtorno do Deficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).

Além da necessária capacitação dos profissionais, manter a comunicação, debates e palestras no ambiente escolar, principalmente, envolvendo os profissionais, é uma importante estratégia para manter a comunidade, a família e a escola alinhados com o tema. Isso permite, inclusive, a partilha de experiências sobre o assunto colaborando, ainda, para a capacitação, ainda que informal, dos professores.

Investir em tecnologia e recursos apropriados para atender às necessidades destes alunos, também, é uma importante estratégia, principalmente, porque já existe no mercado materiais didáticos voltados a diferentes deficiências que trazem benefícios significativos à aprendizagem do aluno. A tecnologia assistiva é também recomendada para a aprendizagem, valendo citar os dizeres de Maykon e Otávio (FEITOZA, SANTOS. 2021):

“A tecnologia assistiva (TA) nada mais é que um recurso flexível no planejamento para a garantia da aprendizagem dos alunos; ela auxilia o professor para que consiga chegar a seus objetivos, ampliando as características funcionais do aluno de modo que consiga fazer as atividades propostas de maneira mais eficaz, segura e independente; isso não significa que o professor não possa auxiliá-los, muito pelo contrário, deve estar sempre perto para facilitar eventuais dificuldades. São exemplos de tecnologia assistiva: aumento das letras para aqueles alunos que têm baixa visão; próteses e órteses etc. Para Galvão (2012), falar de produtos de tecnologia assistiva é falar de um horizonte amplo de possibilidades e recursos; é qualquer ferramenta, adaptação, dispositivo, equipamento ou sistema que favoreça a autonomia, atividade e participação da pessoa com deficiência”.

É importante frisar que o Projeto de Lei nº 844/2023, de autoria do deputado Alberto Fraga, está em tramitação na Câmara dos Deputados e objetiva que todos os professores e colaboradores tenham a capacitação básica para tratar com os portadores de deficiência, bem como que os cursos de licenciatura obrigatoriamente ministrem matérias relacionadas a essas necessidades, ampliando, desta feita, a mão de obra profissional, a manutenção e permanência do aluno com deficiência e o atingimento do compromisso social.

Garantir o direito à educação inclusiva é garantir o respeito à individualidade, é remover barreiras, é quebras paradigmas, é eliminar preconceitas, é renovar a esperança de um mundo melhor.

Leia também sobre gestão escolar.

Formação em Compliance

Referências

BRASIL ESCOLA. Educação inclusiva: avanços e desafios da inclusão na escola pública do município de Taubaté. Disponível em: https://monografias.brasilescola.uol.com.br/pedagogia/educacao-inclusiva-avancos-desafios-escola-publica-taubate.htm

GOES, Diogo José Costa. A importância do compliance como prática educativa inclusiva: a prevenção da discriminação nas escolas. Editora Científica Digital. 2023. Disponível em: https://downloads.editoracientifica.com.br/articles/221010450.pdf

GOVERNO FEDERAL. Projeto de Lei nº 844/2023. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2239231&filename=PL%20844/2023 FEITOZA, Maykon Hoffmeister; SANTOS, Otavio Henrique Rodrigues dos. Educação Inclusiva: dificuldades e intervenções. Revista Educação Pública, v. 21, nº 35, 21 de setembro de 2021. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/21/35/educacao-inclusiva-dificuldades-e-intervencoes


[1] Nomenclatura utilizada pela Lei 4.024/1961.

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Júlia Tiburcio
Mestranda em Direito com ênfase em Compliance na Ambra University.